terça-feira, 31 de maio de 2005

A escritura da desistência começa do final.

E aqui termino a intenção do discurso. Agora que acaba a leitura, acaba todo vestígio de vontade. É, então, dispersão. Negada está a curvatura proposta no início, cumprimento e reverência com tendência ao infinito, provisão da voz amorosa. Suas palmas tornaram vazio o parlatório antes mesmo de ser ocupado. Um discurso, não atrasado mas de desistência. Você escutou, com as palmas das mãos, o sopro dessa platéia que parecia ser mesmo você. As contrariedades todas feitas fora de juridisção tornam-se o ouvinte fantasmático, ele senta-se ao seu lado. Chegou não sabe como ao local do pronunciamento.

O orador engole – quase de uma só vez– o refluxo ainda não ocorrido, em trânsito. A fala repleta-se de locuções que perfuram a língua, mas que fogem ao futuro e de volta ao texto. O ante-discurso de caixa retumba em pulsos de origem desconhecida, pulsúreos que afetam toda a parede de ressonância, você é o belo.

Ressona aquele que fala, a voz é ruído, aqui começa a intenção do discurso.

terça-feira, 24 de maio de 2005

It’s a still life water color,
Of a now late afternoon,
As the sun shines through the curtained lace
And shadows wash the room.
And we sit and drink our coffee
Couched in our indifference,
Like shells upon the shore
You can hear the ocean roar
In the dangling conversation
And the superficial sighs,
Are the borders of our lives.

And you read your emily dickinson,
And I my robert frost,
And we note our place with bookmarkers
That measure what we’ve lost.
Like a poem poorly written
We are verses out of rhythm,
Couplets out of rhyme,
In syncopated time
Lost in the dangling conversation
And the superficial sighs,
Are the borders of our lives.

Yes, we speak of things that matter,
With words that must be said,
Can analysis be worthwhile?
Is the theater really dead?
And how the room is softly faded
And I only kiss your shadow,
I cannot feel your hand,
You’re a stranger now unto me
Lost in the dangling conversation.
And the superficial sighs,
In the borders of our lives.

domingo, 22 de maio de 2005

in a sentimental mood

que bobagem que é afirmar categoricamente. se a desculpa for retórica, ok. mas para uma correspondência, não!
oh-oh.
pior é abarrotar-se de orgulho e carregar. e como carrega-se...
mas muitas vezes é apenas estratégia: efes e erres para construir chão. não é fácil estar sempre fluindo.
contradizer-se pode ter muita nobreza, ou ao menos coragem.
viva a honestidade, mesmo que seja uma manifestação que dura pouco. quando começa, já acabou. e assim por diante. esse jeitinho cifrado não deixa de ser orgulho, por exemplo.
o que quis dizer e devo ao menos admitir é: me sinto infantil quando afirmo que algo é "assim". e sei que faço isso por segurança, mas daqui a pouco ja não é mais. por segurança e para adquirir credibilidade. é muito complicado despir-se de orgulho, muito. não vou estranhar se daqui a um tempo este post sumir, esconder-se de vergonha. já está demorando pra ser publicado... nesse momento estou olhando pra ele, cheia de dúvidas... oh-oh.

sábado, 21 de maio de 2005

chamada interna

Se um dia deus ou o diabo aparecessem pra mim e me anunciassem que preciso apagar uma parte da minha vida, entre as duas seguintes: crítica literária e filmes de entretenimento, eu preferiria apagar a crítica literária. A cada dia que passa mais me convenço de que não seria capaz, por exemplo, de ter como companheiro de vida uma pessoa cujas afinidades comigo sejam fundamentalmente intelectuais. Não é que não goste de falar sobre literatura, mas prefiro fazê-lo pouco e em círculos "formais", com amigos não quero. E gosto de estudar sozinha. Gosto de produzir textos, mas não tenho vontade de falar sobre eles. Acho que o que isso contribui na minha personalidade é basicamente o fato de que tenho paixão pelas palavras. Mas é uma paixão tão honesta que não sinto vontade de falar sobre isso com ninguém, pra mim basta fazer as palavras falarem por si, nos textos (nos cifrados). O que aparece e eu gosto de mostrar dessa paixão é ser apaixonada pura e simplesmente. De um jeito intransitivo.
Prefiro falar sobre filmes, adoro falar sobre música, sobre toda e qualquer porcaria engraçada que aparecer, papo nonsense é comigo mesmo e não gosto de coisas protocolares. Quando encontro com meninas, prefiro falar sobre cabelos do que sobre a última exposição. Quando vou ao CCBB, vejo as exposições super rápido, não tenho muita paciência, prefiro a parte de sentar no café e conversar sobre os erros de português engraçados do cardápio.
Não quero que meu determinante seja uma lista de nomes de peso, um vocabulário de títulos e uma circunscrição num universo mais ou menos fechado com o nome de "maturidade" ou "intelectualidade" e afins. Não pode ser isso o que vai me encaixar em vagas emocionais por aí.
Prefiro um vocabulário de atitudes, reações e interações: gestos, expressões, piadas, afetos, repulsas, compartilhamento, reclusão.

quarta-feira, 18 de maio de 2005

adoro

a palavra adoro. mas não carregada daquele significado "endeusar" ou algo nessa direção. é puramente bonita, o som, o registro, dizer, escrever.
a she-ra chamava-se "Adora", lembrei de repente.

terça-feira, 17 de maio de 2005

morar sozinho

é uma boa idéia.

cada dia percebo o quanto é bom sempre inventar coisinhas diferentes pela casa. novos modos de arrumar as coisas, nem que seja mudar o porta-lápis de lugar, ou catar uns papeizinhos que ficavam há dias do lado do computador.
é uma forma diferente de investimento pessoal, o espaço de uma casa é muito diferente de um quarto.
hoje quis escrever um post pessoal, dar notícias do rio a quem se dispuser a ler. às vezes me perguntam coisas daqui, sei que mudo de assunto. sair de casa e ir morar só implica muitas e muitas sensações complexas e pessoais. por isso, não é fácil, numa conversa de msn, responder a perguntas amigáveis como "e aí, o que tem feito?"

tenho cuidado da vida. sem esquecer que cuidar da vida é, no mais das vezes para homens e mulheres normais, descuidar da vida um bocado também. tenho escutado tom waits adoidado, assistido tv, olhado pro suvaco do cristo redentor deitada na rede e ido à luta. não vou entrar em detalhes emocionais e minúcias reativas mais abstratas... saber dos interiores dos outros é coisa de gente sensível, não de leituras. textos não servem pra essas coisas, nem mesmo declarações descompromissadas de blog. eu que não tenho coragem de dar a um texto uma carga tão pesada... a não ser que ele possa ser muitas outras coisas ao mesmo tempo. mas, cifra por cifra, uma dama não comenta. =)

então, no mais: hoje almocei no vitória régia aqui perto, enquanto a sheila, que já havia almoçado, terminava de limpar a casa. ela é ótima. tudo isso me fez comprar flores, então, nas palavras do florista: um vaso de crisanti grande. bem repolhudos e grenás. mas tirei o plástico em volta, e veio num cachepô de palha, parece um chapéu de matuto. coloquei uma luminária que estava encostada na área de serviço aqui do meu lado, ficou aconchegante. tirei a papelada da mesa, pus lá junto com os livros. amanhã vou fazer feira, quero acordar cedo, e preciso mesmo dar uma volta no parque lage, porque é uma vergonha que eu ainda não tenha passeado por lá desta feita. li vários editais também, para me convencer de que só vou poder tentar mestrado em setembro mesmo. não adianta que literatura portuguesa não vai colar... eu lá sei alguma coisa sobre gil vicente, eça de queirós, camões, não sei quem cardoso? por outro lado, comprei uma montanha de livros em francês, preciso atracar-me com eles e ver se o instrumental funciona. quis ser correta, deu nisso. quem não gosta de nomes citados, pode parar de ler por aqui, porque preciso dividir um pouco do que adquiri: villon completo, tel quel, critique, barthes, ponge, blanchot e ontem acidentalmente comprei um livro de traduções e comentários do f. kothe sobre a obra do celan... eita peste. ah sim, trabalhei também. e fiz capuccino de leite, chocolate e café, sem comprar aquelas misturas com péssima relação custo-benefício.

e agora passou o caminhão de lixo lá fora e deixou um miasma danado de presente pra fechar o post.

quinta-feira, 12 de maio de 2005

5 lindezas

* Hurt, por Johnny Cash
A música meio infantil do Trent Reznor me arrepia na voz do Cash. Amo a simplicidade da interpretação. E o mesmo vale para

* I hung my head, com o Cash também
Que é uma música do Sting. Nessa ele não exatamente canta, é como se fosse inventando uma música na hora, em uma andança qualquer. Cash cantando canções é cru e belíssimo, voz dele vai fundo e longe mesmo sem ter alcance e muita técnica.

* Muriel, Tom Waits
Assim como nas anteriores, a voz aparece quase como que sobre um silêncio, por sua vez sobreposto ao acompanhamento da música.

* Summer Rain, Johnny Rivers
"She's here by me" = subidinha que dá arrepios na coluna.

* Concerto para Cello e Orquestra em si menor, Op. 104, Dvořak, com Yo-yo Ma, Filarmônica de Berlim e Lorin Maazel
Já tinha em mp3 esse concerto com o Barenboim e a Jacqueline Du Pré, com a Sinfônica de Chicago, então comprei o cd numa livraria aqui perto pra fazer a prazerosa comparação... mais notícias em breve.

segunda-feira, 9 de maio de 2005

entropia

silêncio

estar em silêncio significa fazer uma pausa. é sempre reconhecimento, aperceber-se de algo, em geral sobre si. pensar sobre outros é pensar sobre si em sentido reflexo. o silêncio vem como resultado e raiz desse processo. algumas vezes ele propicia reconhecimento, outras é em si a sobreposição de um duplo. reconhecer é encontrar o mesmo, desde que fique claro que o mesmo foi de fato achado. não era uma questão de perspectiva, mas de caminho.

sozinho

pausar sendo estar sozinho, silêncio ocupa maior espaço. estar na companhia de si não é estar, sendo igual. é dividir sempre com o mesmo, cada mesmo reencontrado em cada momento. é ruído de silêncios consecutivos. ensurdece com sua altura, daí o silêncio que por sua vez permite o ruído que ensurdece e assim por diante. com outros, o mesmo esconde-se, embora seja sempre refletido. a imagem deformada assopra o mesmo silêncio reconhecedor. sozinho, é mais fácil escutá-lo.

com tantos reflexos e silêncios, a ordenação insinua-se mais aparente do que é julgada.